"— Nunca lhe aconteceu de parar e pensar que afirmou algo que podia ser o contrário?
—Digo-o de outra forma: há que se parar e perguntar-se o que se está a dizer. Se o fizermos, veremos que não temos outro remédio se não analisar o que se diz, e então percebemos que às vezes dizemos coisas que não têm o menor sentido.
— Ou que às vezes o dizemos porque outros o disseram, sem refletir sobre isso.
—É, e repetimos coisas que de uma forma passiva se instilaram dentro de nós e nos impregnaram. Estou a dizer coisas que não saõ minhas. Certo, mas, na verdade, que coisas são minhas? Por isso digo que somos feitos de papel. O que é verdadeiramente nosso? Muito pouco, quase nada. Talvez todos sejamos os outros.
—É o que dizia Leonardo Sciascia, nosso querido amigo e escritor siciliano, já falecido: no fundo nunca se escreve nada de novo, mas se reescreve.
— O que não sabemos é desde quando. Realmente, das frases dos literatos se aprende muito. Diante dessa frase de Sciascia, um escritor que sempre admirei muitíssimo, surge-nos a questão: e desde quando nos reescrevemos? Porque deve ter havido um momento em que tudo era novo, e depois disso nada mais é novo, estamos a repetir tudo. Nunca sabemos quando o novo principia."
in: José Saramago: o amor possível. Juan Arias. Ed. Manati.
* * *
Agora fiquei em crise existencial. Não sei se prefiro ser origami ou omikuji. :D
1 comment:
É. A vida é cheio disso. Quando um autor precupa mais com a fonte e suas referencia o texto acaba sendo permeado nao pela sua real existencia mas pela influencia de suas referencia. Não existe novo de verdade ou velho de mentira. Existe viver algo que todos ja viveram seja por byron ou Sciascia... e transformar em algo seu, unico. Afinal uma vez que produzida toda peça de arte deixa de ser de seu dono e passa a ser do observador mas cada autor consegue viver e reviver os sentimentos mais antigos de maneira unica. pior do que querer viver o mundo sem olhos é por na sua visao olhos que nao pertencem ao momento. Frustração da critica mal feita. Quando feita em cronica... transforma a visao do leitor na visao do autor, estabelecendo postulados e usando uma retorica sofista estabelecendo que tudo eh nada. ja que tudo na verdade nao existe. Certamente cativante. Mas o uso pratico... na minha opniao eh que o proprio texto se refuta. Estariamos nos vivendo ou dizendo oq queremos ou sendo convencidos pelo ego da figura de saramago que brinca nao so com o amor mas com a sinseguranca que vive dentro de todos com relacao ao que nao se tem controle?
Mas quem sou eu. Mal escrevo portugues imagina falar sobre algo que o saramago escreveu.
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